
E mesmo esses, que me parecem tão ofuscados pela nuvem do inimaginável quanto eu próprio o era para o russo que observei há pouco, decerto um dia parecerão empoeirados, cegos pelo cabresto de seu próprio tempo. Sequer humanos.
Quanta humanidade já não habitou e habitará este planeta, em sua intensidade e calor plenos? Quantas sensações não foram enterradas com os anos, incapazes de serem retratadas nas fotografias e pinturas? Pois mesmo por meio das mais densas artes, como a escrita, não é possível aprisionar uma pessoa e reservá-la à eternidade. Nos dissolvemos a todo instante. Em pouco tempo, o que restará de nós serão nossas inscrições no mundo, cada qual responsável por registrar apenas uma face de nossas tantas faces. Talvez seja daí que os humanos retirem essa gana de produzir o diverso: música, filosofia, arquitetura, literatura — tudo isso não passa de uma forma refinada de lutar contra a morte, mesmo que em vida. Uma tentativa incessante, tão profunda e desesperadamente humana, de resistir. De existir.